sexta-feira, 27 de novembro de 2009

A DIFÍCIL COBERTURA RADIOFÔNICA DO FUTEBOL DO PASSADO EM RONDÔNIA

Após algumas discussões, resolvemos abordar na reportagem especial, na segunda parte do trabalho, como era feita a cobertura radiofônica do futebol na imprensa da capital no passado.

Começamos o trabalho elaborando uma lista de radialistas para colher depoimentos com imagens. Valter Santos Barbosa, Bosco Gouveia, José Ribamar, Elvestre Jonhson, Júlio Aires, Lenilson Guedes, Antônio Pessoa, Carlos Neves, Carlos Souza, Orivaldo Canosa, Águido Melo, Ivan Gonzaga, Orivaldo Canosa, José Agusto, Francisco Santana, Francisco Coelho, Lucivaldo Souza, Euzébio, Carlos Neves, João Tavares, João Dalmo, Rômulo Ruiz, Beni Andrade, Enéas Martins, Pinheiro de Lima, Everton Leoni, Gilson de Oliveira, Valmir Miranda, Dalton di Franco, Augusto José, Volnei Alonso, Miguel Silva e Fernando José são alguns dos integrantes de equipes de radialistas que fizeram a história nas transmissões esportivas na Capital de Rondônia.

O principal foco a ser abordado recai sobre as dificuldades de fazer coberturas esportivas em um período no qual a tecnologia ainda era muito precária.

Essas coberturas eram feitas com muito esforço por profissionais que trabalhavam mais por prazer do que por dinheiro. As improvisações para coberturas em outros municípios ou fora do Estado eram verdadeiras aventuras.

Não delimitamos o número de entrevistados. As entrevistas foram realizadas, no entanto, apenas dentro do prazo limite para entrega do trabalho, ou seja, 20 de novembro de 2009. Como o tema é palpitante e ainda há muitos profissionais que merecem ser ouvidos e têm informações novas a passar, pensamos em ampliar a reportagem para um trabalho futuro com maior disponibilidade de tempo.

Outro objetivo do trabalho é mostrar para a atual e futura gerações como era feita a cobertura do esporte especializado nas rádios locais. Em um determinado período, a Caiari passa a ser a única emissora em atividade, por isso a rádio é citada na maioria dos episódios.


Locutores levando choques elétricos dos microfones, repórteres de campo carregando gravadores enormes e pesados durante as transmissões ao vivo. Essas são algumas situações ocorridas em Porto Velho no passado nas coberturas de futebol. Em meio a tanto sufoco, prevaleceram o amor à profissão e à vontade de fazer um trabalho bem feito com tantas adversidades. Para o radialista Evestre Johnson, de 70 anos, que foi escolhido por Pelé para fazer a primeira pergunta de uma coletiva antes de a seleção brasileira seguir para o México e conquistar o tricampeonato mundial em 1970, “tudo valeu a pena.”

Há 31 anos, precisamente em 1º de oububro de 1978, Bosco Gouveia chegava de Pernambuco e começava sua carreira como locutor esportivo em Rondônia. As dificuldades para as coberturas esportivas, de acordo com Bosco, eram tantas que não dava tempo de reclamar. “Locutores, repórteres de pista, comentarista... toda equipe se juntava aos técnicos em busca de soluções que o momento exigia.”

Entre os muitos problemas enfrentados por Bosco estão casos pitorescos. Durante a transmissão de um jogo (ele não se recorda qual) levou um choque na boca, ao encostar os lábios em um microfone de metal e deu um grito instintivo e desesperado. Foi obrigado a explicar o ocorrido no ar, segundo ele, pensando até mais em tranquilizar sua família que escutava a partida em casa do que fazer uma justificativa ao público.

Bosco diz que esses choques eram normais. Os microfones eram de metal e se transformavam em perigo maior quando molhados. A regra, segundo narrador, era mantê-los afastados da boca. “Levava constantes choques, mas suportava calado. No “dia do grito” a dor foi intensa, não deu para segurar a barra”, diz Bosco, hoje achando graça de tudo isso.

Bosco recorda que as antigas coberturas esportivas eram feitas pelo sistema de “chaveamento”. O locutor para conversar com o plantonista e o técnico no estúdio teria que mudar de posição a chave de um aparelho esquisito e muito pesado. Para ter o controle do áudio novamente teria que retornar a chave à posição original. Era uma inovação, mas nem sempre dava certo.

O radialista diz que, em várias ocasições, narrou trechos de partidas de futebol sem eles irem para o ar. “Eu simplesmente esquecia de voltar a chave e o comando de voz ficava nos estúdios. Quando percebia a falha, já haviam passados alguns minutos. Eu dava sempre uma desculpa. A predileta era colocar a culpa na Embratel. Aproveitava para enaltecer o trabalho da equipe da rádio, detalhando as dificuldades de uma cobertura esportiva.”

Esse problema, de acordo com Gouveia, era mais sentido nas coberturas fora do Estado. Na Capital ele ligava um rádio de pilha e sabia quando sua voz estava no ar ou fora, se fosse o caso Em outras cidades, como não existia ainda celular e era inpossível captar as ondas pelo radinho, o pessoal do estúdio não conseguia manter contato. “O plantonista ficava enrolando até reestabelecer o contato quando eu ou alguém percebia o posicionando errado da chave.”
Outra dificuldade destacada por Bosco era o retorno de voz, que poderia durar até 20 segundos. Para não dar um intervalo muito grande, eu antecipava quando percebia que a mensagem vinda do estúdio estava sendo finalizada. “Às vezes acabava atropelando o locutor do estúdio e nós dois falávamos ao mesmo tempo.”

Ferando José, o Pinguilite, famoso nos meios esportivos por contar “causos” das transmissões esportivas, teve um papel importante nas décadas de 1970 e 1980. Ele produzia efeitos especiais com a própria voz, criando “ecos” e outros sonoridades clássicas no futebol até hoje. Essas tarefas atualmente são facilmente realizadas no computador, mas na época era uma façanha, uma união de boa voz, talento e muita criatividade. “O incrível é que Pinguilite fazia isso ao vivo durante as transmissões”, diz Bosco

Cabos e fios encobriam os gramados

Valter Santos Barbosa, de 69 anos, começou a carreira de radialista carregando fios, nas transmissões da Rádio Difusora do Guaporé, em 1965. De acordo com Valter, muitos grandes profissionais no Brasil começaram assim. Carregar fios, segundo ele, dava muitos empregos e era uma forma, para quem tinha talento, de iniciar na profissão, Valter que é considerado o maior zagueiro do futebol rondoniense de todos os tempos, aliou as profissões de jogador de futebol e radialista. Sobre o emaranhado de fios nos grandes jogos, Valter, que atuou também como zagueiro no Nacional de Manaus, tem uma visão saudosista. Ele acha que os repórteres de pista realizavam um verdadeiro balé. “Vendo do alto, a correria dos repórteres e dos carregadores de fios era um espetáculo à parte.”

Padre traz equipamentos da Itália

O radialista Lucivaldo Souza, com 38 de experiência na área, entende que os problemas técnicos até a década de 1980, em sua maioria, eram agravados por falta de pessoal especializado em assistência nesta área. De acordo com ele, os serviços eram feitos por amadores que ele chama de “curiosos.”

Para Lucivaldo, Francisco Alves Monteiro, o Abemur, era o grande nome da técnica na época, mas aprendeu tudo durante as transmissões, “fazendo testes atrás de testes para descobrir aonde estava o problema.” O radilista, que já atuou como comentarista e locutor esportivo da Caiari, diz que os equipamentos da emissoria eram considerados de boa qualidade para a época, há mais de 45 anos. Foram importados da Itália pelo padre Vitor Hugo, ex-diretor da rádio.

Francisco Coelho, que autou como repórter de pista na rádio Caiari, no final da déca da 1980, uma época já com mais recursos técnicos para transmissão de futebol, diz que enfrentou dois problemas singulares quando cobria futebol: insegurança e falta de dinheiro. Coelho conta que um torcedor, durante uma cobertura, invadiu a área restrira à imprensa e demais envolvidos na cobertura para tirar satisfações com ele. Pior: de ordem pessoal. O repórter diz ainda que era funcionário da emissora e não ganhava extra para cobrir futebol nem nos feriados e nos finais de semana.

Problemas direto do Paraguai

A falta de estrutura para realização de grandes coberturas esportivas, levou o ex- governador Coronel Guedes a desacreditar que uma equipe de rádio local pudesse fazer a cobertura de Brasil e Paraguai, válido pelas Eliminatórias da Copa de 1978, em Assunção, capital paraguaia.

Quem não tinha dúvidas sobre a viabilidade da cobertura era o então chefe da equipe de esportes da rádio Caiari, Ivan Gonzaga. “O homem” (o governador) “estava irredutível em patrocionar nossa equipe. Ele não acreditava que a transmissão seria possível. Afinal, bancar um projeto não executado seria um prato cheio para os adversários políticos,” relembra Ivan, que, depois de muito inisistir, conseguiu que Guedes, um apaixonado por futebol, bancasse as passagens aéreas.

No dia do jogo, recorda Ivan, a Rede Globo que começava as transmissões em cima da hora já mandava imagens ao vivo do Paraguai. “Comecei a ficar preocupado porque não tinha, até àquele momento, contato algum com os repórteres. Telefonei para o diretor da Embratel e cobrei soluções.”

“ Neste interim” - continua Ivan - “o governador me ligou apavorado, pois a rádio não estava transmitindo o jogo. Naquele exato instante, com o “coronel” ainda na linha, a equipe da técnica conseguiu contato com Assunção e a transmissão foi iniciada. Então, relaxado, eu respondi ao governador que deveria ter algum problema com rádio dele porque a transmissão já havia começado e com boa qualidade de som.”

Encontro com o Rei Pelé

O radialista Elvestre Johnson, 70 anos, trabalhou em transmissões esportivas até 1968 na chamada Baixa da União em Porto Velho, onde hoje é área do 5º BEC. Na região ocorriam torneios envolvendo times dos bairros Triângulo, Areal e Caiari, de onde eram revelados craques para os principais times da época.

A cobertura das partidas da então rádio Difusora do Guaporé, segundo Johnson, era feita por fio telefônico, que era puxado a partir da rádio - um galpão na avenida Farquar, onde funcionava a residência dos ingleses e havia também um clube de danças.

O polivalente Elvestre, que era comentarista e fazia também as reportagens, andava com um gravador de 20 centímetros e muito pesado, segundo afirma. Ele gravava as reportagens com os jogadores e levava em seguida o aparelho para próximo do único microfone acoplado ao fio telefônico, de onde partiam todas as vozes da transmissão. Qualquer problema na Radional, hoje Embratel, a transmissão era suspensa. Johnson lembra que, mesmo debaixo de chuva, a transmissão era mantida. Um guarda-chuva era usado mais para proteger o microfone do que o locutor.

Em maio de 1970, Jonhson conta que viveu a maior emoção de sua vida, quando a Seleção Brasileira, que se tornou tricampeã, fez a última preparação no Brasil - em Manaus - antes de seguir para o México. Titulares e reservas do Brasil formaram dois times e enfrentaram dois combinados amazonenses. As equipes A e B do Brasil golearam por 4 a zero e 5 a zero, respectivamente.

Logo após a partida, todos os repórteres de campo correram em direção a Pelé. O tumulto foi grande. Pelé pediu calma e apontou a para Johson, dizendo: “Você faz a primeira pergunta.” Jonhson quis saber do rei do futebol o que ele sentia em estar atuando na Região Norte. Pelé, ligeiro como sempre, respondeu: “O nome disso é integração.” Pergunta e resposta percorreram o mundo.


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